Giovanna é ilustradora e designer com raízes na Arquitetura e design de mobílias, descobrindo seu caminho em Design Editorial e Ilustração através de sua paixão por artes plásticas, música, desenho, contracultura e sua influências do punk em sua adolescência. Giovanna compartilha três referências que marcam sua carreira e deixa uma provocação para o mercado.
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Minha história com o design começa pela paixão pelas artes plásticas, a música e o desenho. A contracultura e o faça-você-mesmo sempre me atraíram. Passei minha adolescência no punk e acho que isso me alimentou de referências: capas de discos, zines, colagens. Eu vivia em lojas de discos, sebos e shows inundada por aquele sentimento de autogestão. Uma grande influência também foi a descoberta da arte brasileira dos anos 60 que tinha um caráter social e político muito forte – além de ser linda. Cildo Meireles e Hélio Oiticica se tornaram meus artistas favoritos.
Essas ideias e estéticas reverberam em mim até hoje. Lembro que estava lendo o “Lina por Escrito”, durante a faculdade, quando um amigo me indicou para uma vaga de estágio onde ele trabalhava. Foi uma coincidência muito feliz: fui trabalhar com o Paulo Alves, arquiteto e designer de móveis que trabalhou com Lina Bo Bardi em uma das últimas obras dela. Trabalhei com design de mobiliário junto com Paulo durante 5 anos, dando assistência em alguns projetos e criando algumas peças também. Uma das coisas mais legais dessa época foram alguns trabalhos que fizemos para o SESC (inclusive no Pompéia, que é uma das obras marcantes da Lina).
Ainda hoje sou apaixonada por essa área, mas fiquei um pouco frustrada com alguns aspectos desse mercado. Os trabalhos como o do SESC eram uma exceção e a grande demanda do mercado era por peças caretas, repetitivas e para um público super elitizado.
Comecei a transição para o Design Gráfico, que me parecia ser uma área em que eu poderia explorar um traço mais autoral em um produto mais acessível – era uma vontade minha – e junto com isso surgiu a oportunidade de trabalhar junto com o Guilherme Xavier na Desenho Editorial. Com o Guilherme, aprendi a base do que é trabalhar com livros. Ele foi super gentil e sou muito grata por tudo que me ensinou. Em 2017, comecei a trabalhar em casa e fazer apenas freelas para a Desenho Editorial. Isso me fez correr atrás de outros clientes e olhar para ilustração com um pouco mais de seriedade. Comecei a fazer cursos com Lourenço Mutarelli e DW Ribatski e, a partir daí, fui tentando incluir ilustrações nos projetos editoriais que eu criava.
Nesse mesmo ano, fiquei muito feliz quando fui convidada para fazer uma ilustração para “A Hora do Lobisomem”, do Stephen King, lançado pela Companhia das Letras. Acho que isso foi bem marcante para mim, pois senti que esse caminho autoral que eu buscava tinha alguma chance de dar certo. Comecei fazendo algumas capas para editoras pequenas ou projetos editoriais de amigos e assim fui entendendo melhor essa mídia.
Acho que o momento mais marcante da minha carreira até agora foi a criação do projeto gráfico e capa do Laranja Mecânica. Foram alguns meses de pesquisa, redesenho de tipografias e busca dessa linguagem para a ilustração. O direcionamento inicial (e super importante) foi do Daniel Lameira, editor da Aleph, que escolheu a cena da capa e ponderou esse processo de criação. Fiquei muito feliz quando fui premiada com ouro na categoria editorial no Latin American Design Awards de 2019 pelo projeto deste livro. Uma grande conquista e um incentivo imenso para acreditar em mim mesma.
A linguagem que o Ivo explora é maravilhosa. Ivo cria histórias em quadrinhos com traços surreais. A coragem de ir para caminhos novos me inspira e me atrai muito.
Sinto um frescor nas massas de cores e no modo de representação das obras da Heloisa. Me encanta muito esse universo estético dela.
Marcela é uma artista plástica que une temas políticos e composições riquíssimas. Em muitas de suas obras, Marcela homenageia mulheres de várias partes do mundo que lutaram pelos seus ideais.
Recentemente, o famoso designer Milton Glaser faleceu (Junho/2020). Comecei a ler algumas entrevistas do Milton e encontrei essa matéria de 2006, em que durante uma palestra, perguntaram ao famoso designer porque há tão poucas mulheres “superstars” no Design Gráfico? Milton respondeu:
“A razão pela qual há tão poucas rockstars no design gráfico é porque as mulheres ficam grávidas, têm filhos, vão para a casa e cuidam das suas crianças. E esses são anos essenciais em que os homens estão investindo em sua carreira, ganhando visibilidade. Isso é privado das mulheres que escolhem ficar em casa. A não ser que algo muito dramático mude na natureza humana, isso nunca vai acontecer”.
Então, foi perguntado sobre a assistência de babás e creches na criação das crianças para deixar a mãe mais livre, e ele respondeu: “Nenhuma dessas soluções é boa”.
A frase “isso nunca vai acontecer” ecoou como um golpe em mim já que, além de mulher, eu sou mãe. Um dos motivos de eu migrar para o Design Gráfico foi justamente a possibilidade do trabalho remoto e de eu poder passar mais tempo com meu filho.
Apesar de ser muito duro ler isso de alguém que considerava um profissional incrível, esse sentimento de revolta me fez querer ser uma rockstar só para provar que é possível. Me faz querer elevar todas as profissionais incríveis que eu conheço e mostrar para outras mulheres que é possível.
Enfim, minha provocação é: quero mais mulheres rockstars no design gráfico. Agora.